Intérprete de Libras da live de Marília Mendonça fala sobre repercussão após performance

Gessilma Dias nos bastidores da live de Marília Mendonça — Foto: Arquivo Pessoal/Viny Batista

Por Braulio Lorentz, G1

Gessilma Dias estava descansando após quase três horas e meia de performance na live de Marília Mendonça, quando a cantora entrou na salinha onde ela estava.

A estrela sertaneja foi a primeira a falar que a fonoaudióloga e intérprete de Libras de 46 anos estava sendo mais comentada do que de costume nas rede sociais.

“Ela me falou ‘você virou meme, depois dá uma olhada’. A gente estava ainda sem um retorno do mundo externo”, conta Gessilma ao G1.

“Gosto de valorizar quem é prata da casa. Ela é muito nova e tem um histórico de luta muito grande. Tenho uma preferência por meninas que desbravam um mundo sertanejo masculinizado.”

50 músicas para traduzir

Gessilma foi chamada pela equipe de Marília meio em cima da hora, um dia antes. “Eu fiquei muda quando soube. Não sabia se era trote ou não.”

Primeiro, a intérprete recebeu um setlist com 30 músicas, que depois mudou para 50. Era tanto trabalho em tão pouco tempo, que ela convidou outro tradutor, Viny Batista, amigo dela.

“Eu pedi o repertório pra poder estudar. É difícil traduzir metáforas, tem algumas expressões que tem pesquisar com a própria comunidade.”

E como foi a maratona da live? “A gente ficou muito cansado, se perdeu em algumas horas. Você fica cansado e o raciocínio da tradução vai ficando defasado. Mas a gente deu conta do recado e a comunidade surda pôde prestigiar um show que não veria.”

Todo suor rendeu muitas mensagens no celular. “Eu recebi muita foto, muitos recadinhos como ‘meus irmãos são surdos’, ‘minha mãe é surda’. Foi muito produtivo.”

Também teve um lado pior, com criação de perfil fake no Instagram e alguns comentários um tanto maldosos:

“Achei interessante que teve gente falando que eu era uma ‘idosinha’, que eu era grupo de risco e não deveria estar ali. A luz ficou muito contrastante e eu não estava maquiada, não tinha uma preparação prévia. Mas achei engraçado.”

Outros memes associaram um sinal feito por ela ao chifre, tema comum nas músicas sobre traição de Marília Mendonça. Mas ela explica:

A sertaneja Marília Mendonça transmiti show nesta quarta (8), no seu canal do YouTube. Diferente de outras exibições, a cantora tem feito com covers, desta vez a ideia é usar e abusar do repertório construído ao longo de quatro anos de carreira. Ela se cercou de cuidados para esta nova apresentação virtual. A intenção é arrecadar donativos para auxiliar às vítimas da crise que tem se instalado no Brasil com a pandemia do coronavírus. — Foto: Caio Rocha/FramePhoto/Estadão Conteúdo

“É o sinal eu te amo, que é universal. Você mostra o polegar, o indicador e o dedo mínimo com a mão virada pra frente.”

Gessilma também explica a empolgação na performance, que fez com que muita gente pensasse que ela era uma fã que estava ali curtindo músicas como “Infiel” e “Todo mundo vai sofrer”.

“Se estou fazendo a tradução no ‘Jornal Nacional’, sobre a pandemia, não posso traduzir sorrindo. Não poderia estar cantando como um robô, séria”, explica ela, séria.

Marília Mendonça na liveG — Foto: Reprodução/YouTube da cantora

“Se estão todos se divertindo, tenho que passar isso também. A expressão corporal faz parte da língua. Eu não estava curtindo o show. Eu nem estava ouvindo a música, só estava com o retorno do microfone da voz dela.”

E depois de tanta exposição e tantas entrevistas, o que espera agora? “Eu espero que tenhamos uma visibilidade que a comunidade surda precisa ter, que isso se transforme em ações efetivas.”

“Temos muita legislação que não é cumprida. Não pode ficar falando apenas ‘nossa, que bonitinho’. Tem que ir além disso. Não quero holofote pra mim, eu quero os holofotes pra comunidade surda.”

“Eu quero escolas e hospitais com intérpretes. Com todo mundo de luva e máscara, não pode nem olhar pra boca da pessoa pra entender o que ela está falando.”

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui